domingo, outubro 30, 2011

Crônicas Anacrônicas - Amarelo #conto1

Desligou o telefone. Postou-se novamente para arrumar os cabelos.
-Oito e meia -pensou- o cinema estava marcado para as nove e vinte. Tudo bem que o shopping ficava a apenas 10 minutos de carro dali, mas a tarefa de escolher a roupa ideal não seria fácil.
A maquiagem já estava feita. Alguns segundos se contemplando no espelho e conseguiu se achar uma mulher bonita. Particularmente naquele dia.
Oito meses de namoro, e isso pedia um cuidado especial no visual.
Já havia algum tempo que não se sentia bonita. O cotidiano deixara marcas que a diminuíram aos poucos.
Rapazes a elogiavam pela rua às vezes e suas bochechas se enrubreciam. Era gostoso se sentir desejada. Mas não era nenhum deles a quem ela queria.
Manteve por todos esses oito meses seu pensamento nele. Não por questão de fidelidade ou por não existirem opções, mas pelo simples sentimento que tinha. E só isso já era mais do que suficiente.
Hoje ela estava se arrumando para ele. Assim como se arrumou cada um desses oito meses, mesmo nos dias que não se viram.
Oito e cinqüenta e três. Abriu a porta do closet. Passou os olhos por todas as roupas achando cada uma feia demais para aquele dia.
O significado daquilo merecia algo melhor. Talvez um vestido de gala - que ela não tinha.
-Sim, eu sei que será apenas um cinema e depois jantar em algum restaurante simples -exclamou para si mesma.
Mas a vontade de algo mais não era pelo evento, e sim pelo sentimento que brilhava em seu peito.
De repente olhou para o último cabide e nele viu aquele vestido.
Aquele vestido impregnado de lembranças. Amarelo.
Foi o vestido que ela usara no primeiro encontro e, depois, nunca mais.
Mas ele já havia dito umas duas ou três vezes que lembrava o quanto ela estava maravilhosa nele.
Isso fez com que aquela chama brilhasse mais forte. E a decisão foi fácil.
Vestiu-se e se sentiu especial. Sentiu-se linda como nunca. Estava pronta para o encontro, pronta para ele.
Lembrou-se da primeira troca de olhares e também do primeiro beijo.
Sorriu involuntariamente, e essa imagem refletida no espelho parecia mágica.
Calçou o sapato, pegou a bolsa e saiu para se encontrar com o seu amado que havia marcado às 9 em ponto na porta de casa.
Mais lembranças vieram à sua mente enquanto caminhava em direção ao carro.
A primeira vez que foram ao cinema, quando ela o apresentou a seus pais, a surpresa que fez para ele em seu aniversário... Tantas lembranças!
O coração batia acelerado, mal podia esperar para entrar no carro e ser beijada.
Abriu a porta.
-Atrasada 15 minutos! Se a gente perder o filme, a culpa é sua.
Mal ela fechou a porta e ele, sem tirar os olhos do parabrisas, acelerou o carro em direção ao shopping.